Os vizinhos, o jardim e o Senhor

Nossa casa fica entre outras duas. É uma casa, como fala em português? Geminada? Gosto de pensar em germinada. Jardinada. Verdejada? Se dependesse de mim, passaria mais tempo no pequeno jardim, mas nao posso, porque tenho muito o que fazer dentro de casa e com dois filhos pequenos pra cuidar, nao me sobra muito tempo livre, além disso tenho alergia a pólen. Mas esta primavera está tão chuvosa e fria, tão diferente do ano passado, que nem mesmo pólen tenho sentido!

Mas o jardim! Ah, o jardim! Como tem me feito bem. Não sou nada entendida de plantas e flores, embora seja engenheira florestal de formacao - OK, nao tem nada a ver, planejamento e exploracao florestal (minha área preferida da profissão) com flores num jardim. Mas, era de se esperar que eu entendesse de plantas, nao é? Mas, me dá um desconto, vai! Meu jardim fala alemao! Tenho custado a entender aqueles nomes estranhos de flores que minha vizinha fica me explicando. 

Aliás, a foto que estampa esta postagem, é uma pequeniníssima visao da casa dela. Nao temos muros que nos separam, e os jardins se encontram. A vizinha da esquerda é um amor, nao para em casa pois tem três filhas adolescentes, trabalha muito e vive saindo com seu cachorrinho, ou vai jogar tênis (aliás, sua filha mais velha, uma linda e gentil menina, ganhou o campeonato na cidade ano passado!). Mas os vizinhos da minha direita estao sempre pra lá e pra cá e os vejo o tempo todo. O marido toca piano lindamente. E ela mais parece uma menina do dedo verde. Está sempre no jardim, observando cuidadosamente suas plantas. Eles têm três filhos já adultos que nao moram mais na casa, mas que sempre visitam os pais: os filhos têm 24, 26 e 28 anos e sempre que estão por aqui, brincam de bola com os pais no jardim. Sao cenas bonitas que vejo. Que bons pais meus vizinhos parecem ser! Aparentam ser uma família muito respeitosa, nunca vi ninguém de cara feia ou falando alto e aparentemente, sao cristaos. E me envergonho algumas vezes, por viver gritando com meus dois pequenos, com esse meu temperamento latino e esquentado de ser. 
Tenho aproveitado a nossa área livre, enquanto o governo não nos proibe de tomar sol, de nos movimentar, de respirar, de plantar. Soube que em algumas regioes dos Estados Unidos, na época da quarentena, sementes nao sao consideradas artigos de primeira necessidade... mas e se pessoas quiserem plantar seu próprio alimento?
Nao sabemos onde vamos parar. Onde e como vai acabar tudo isso.
Que tempos estranhos esses, nao?! Eu ainda nao estou acreditando em como o mundo mudou tao rapidamente!  É como se fosse agora um outro mundo. Outro dia eu estava lendo um livro infantil para minha filhinha, e havia cenas do cotidiano, sabe? Pessoas passeando, uma feira livre, aeroportos, teatro, ninguém de máscara... foi me dando uma tristeza, uma angústia, sei lá... Será que nunca mais será mesmo, o mesmo mundo de antes?

Tudo muito estranho. Eu acho. Você nao?

Mas a vida se renova como no jardim, e vejo Deus ali! Ele está em cada plantinha que se abre, na cor de cada flor. Nas gotas de chuva que nao param de cair. Na abelha que faz zumzum, na bola que gira nos pés dos vizinhos, nos saltos das minhas criancas no pula-pula no meio da grama, no latido do cachorrinho da vizinha, no cair da folha, no canto do passarinho, na morte e no nascer da vida, maternidades e cemitérios ocorrem no meu jardim. 

Deus está aqui e em todos os lugares e nao me deixa desistir de ter esperança... nEle! Nao neste mundo, porém...